Trocas e Devoluções – O dia seguinte.

Todo ano existe o day after que é o dia seguinte à troca de presentes que ocorre no Natal e que são oriundos das reuniões em família e de festas de amigos-secretos. Mas esse problema nas lojas de informática dura o ano todo. O que pode ser feito para reduzir essa dor-de-cabeça de lojistas e consumidores?

A empresa de um amigo meu acendeu o alerta por conta do volume de devoluções que crescia bastante. Preocupado, pediu uma análise. Na análise descobriram que naquela sopa de devoluções existia muito mais do que pensavam em um primeiro julgamento.

Em empresas de informática as devoluções e trocas são uma constante e a base disso é a falta de conhecimento por parte dos clientes e vendedores e a desorientação de alguns técnicos.

A política de troca e de devolução obedece ao disposto na Lei do Consumidor e no bom-senso do lojista e fabricante. O produto pode ser trocado por outro ou o dinheiro ser devolvido. Em todos esses casos acontece um problemão no controle interno das lojas de informática. O produto devolvido é encaminhado novamente ao estoque, os impostos são estornados juntamente com a comissão do vendedor e a nota fiscal cancelada. Isso consome algumas preciosas horas de trabalho de várias pessoas e mexe com quase toda a empresa.

Nessa empresa, esse custo estava se tornando maior que simplesmente o de trocar o produto, apesar de, na maioria das vezes, o cliente acabar comprando algo mais caro na troca. Nas devoluções ou por RMA ou por incompatibilidade o prejuízo é maior pois a venda foi perdida mesmo e o custo de substituição da peça defeituosa ou da sua reinserção no estoque traz um custo indireto bastante elevado. Sendo bem direto: PREJUÍZO certo.

Na época das festas de fim-de-ano a quantidade de trocas é grande, mas as devoluções quase zeram. Geralmente quem vem trocar leva algo mais caro, pois o complemento em dinheiro ao que ganhou de presente é sempre bem menor que ter que desembolsar tudo de uma vez. Nas lojas de informática isso não acontece dessa forma. A maioria delas está se recusando a trocar produtos que foram comprados errados ou que não apresentem defeito de fabricação.

E essa foi a cruzada dessa empresa: descobrir onde morava o problema.

A investigação descobriu coisas muito interessantes em relação a trocas e devoluções:

A) Produto com defeito

B) Indicação errada do técnico

C) Compra errada

D) Indicação errada do vendedor

A TROCA POR DEFEITO

Primeiro lugar na pesquisa, este tipo de troca é responsável por cerca de 3 em cada 10 trocas ou devoluções. Nesse levantamento alguns fabricantes foram chamados a melhorar a qualidade dos seus produtos ou foram substituídos por outros de melhor qualidade. Não vale a pena vender o produto barato de garantia alta quando o volume de trocas é elevado. Em algumas situações ficou definido que se o volume de defeitos superasse a marca de x peças seria enviado a assistência técnica um aviso de ‘risco de recall’. Isso evita prejuízo maior e preserva o cliente e o lojista de vários aborrecimentos, pois ninguém quer ir a uma assistência técnica assim que compra um produto. Outro dado interessante é que mais da metade do que é trocado por defeito é proveniente do perfil produto fabricado na China em OEM para determinada marca.

A COMPRA ERRADA E A INDICAÇÃO ERRADA DO TÉCNICO

Em segundo lugar com quase 3 ocorrências por cada 10 trocas ou devoluções (e essa foi a minha grande surpresa), ficou a compra errada. Ela acontece por conta de engano do cliente ou por indicação errada do técnico. Temos vários casos interessantes. Resolveram então documentar alguns casos de compra errada para entender melhor como acontecia. Em um desses casos o cliente entrou na loja e pediu um cartucho para a impressora dele. Sabia apenas a marca, mas não sabia o modelo. Ele ‘ achava’ que era um parecido com o que tinha lá. Vender assim é troca certa. Em outro o cliente entra na loja e pede coisas que precisam que o vendedor entenda o que ele deseja. Alguns pedem mouse usbi(USB), uifii (WiFi), disco de bote (Boot), bootuti(bluetooth), omitite (Home theater), sexpoint (Acess Point) entre outros.

Até ai vale a justificativa do desconhecimento por parte do cliente e para isso existe o vendedor. Mas quando o erro é do técnico o problema é maior. Muitos clientes se consultam com seus técnicos por telefone e vão às lojas com especificações erradas. A maioria dos erros está nas especificações de roteadores e switchers, memórias, conexões USB e PS2, cartuchos e papéis. Placas de vídeo e de captura de vídeo também formam a lista de compras erradas por indicações dos técnicos.

A empresa citada possui um técnico em cada loja mas o cliente não o consulta e na maioria das vezes acaba comprando errado. Tais especificações técnicas são repletas de detalhes e exigem atualização e atenção constantes. Uma boa parte dos clientes só passa a consultar o técnico da loja quando teve a dor de cabeça de não poder trocar o produto. Ai a briga é feia, pois o técnico do cliente não assume o erro e o cliente não quer ficar com o prejuízo e ai vai atrás da loja.

Na pesquisa detectaram que esse era um dos pontos de maior risco. Isso gerou uma ação preventiva. Todas as solicitações vindas de técnicos de clientes e que se encaixem nos itens que mais são devolvidos são conferidos pela empresa. Em outras situações os clientes vêm à loja com seu técnico à tira-colo. Quando chega só as vezes o cliente se chateia pois, chega com a indicação no papel e quer levar aquilo que o técnico mandou comprar. Não aceita argumentação.

No caso dos cartuchos a empresa decidiu conferir antes de vender. Em algumas situações chega a ligar pra casa do cliente para ter certeza do modelo da impressora. Só depois é que vende. Vale tudo para evitar a troca ou a devolução.

As compras erradas, pela Lei do Consumidor, não são passíveis de troca, mas algumas lojas dão 48 horas para o cliente ter certeza. Em outras está afixado logo na entrada um aviso informando que as trocas são feitas apenas se o produto apresentar defeito. Nesse ponto outra recomendação da empresa foi informar e lembrar ao cliente que a empresa não troca produtos com defeito e disponibiliza o técnico de plantão para que possa tirar suas duvidas e até mesmo instalar o produto que está comprando. E no caso de ser instalado pelo técnico da loja ainda tem a garantia de 90 dias no serviço executado.

INDICAÇÃO ERRADA DO VENDEDOR

No início apostaram que os erros eram causados pela desatenção ou desinformação do vendedor. Mas ao separar os ingredientes da sopa de trocas e de devoluções perceberam que o vendedor possuía baixa parcela de culpa. Os erros de venda mais comuns eram, por exemplo, vender uma coisa e entregar outra. Na realidade era o confundir-se. Um caso aconteceu com um cliente que pediu e pagou por um HD SATA e lhe foi entregue um IDE. A falha foi constatada e imediatamente trocado o equipamento. Em outro o cliente perguntou se tinha joystick. O vendedor apenas apontou o local onde estava e esqueceu de perguntar o tipo de conexão (Playstation ou computador). Outro erro constatado de venda e outro produto trocado. Todos esses cases coletados no sistema do SAC e na pesquisa realizada pela auditoria são divulgados internamente juntamente com a solução padrão a fim de que não tornem a acontecer. Os vendedores e gerentes são treinados toda vez que alguma situação negativa começa a virar rotina ou quando um novo produto chega para ser revendido.

A LEI DE GERSON

Em todos os lugares existem os bons, os maus e os golpistas ou os ‘171’ e aqui nessa empresa não foge à regra. Algumas situações são suspeitas logo de cara, como por exemplo a troca de games. O cliente leva o game pra casa e diz que o CD não rodou. Na política de trocas dessa empresa os games não são trocados a não ser que o defeito seja constatado pela assistência técnica deles. Se isso acontecer o cliente recebe um novo e o defeituoso enviado ao fabricante que o repõe ou desconta o valor da duplicata de pagamento. Mas chegam casos muito malucos. Alguns beiram ao absurdo. Lacres recolados até com super-bonder é um deles. Em outros os equipamentos chegam queimados por chaveamento errado de tensão (110V/220V) e o cliente diz que ‘não sabia'(o que se chama de Efeito Lula).

A maioria dessas situações foi mapeada e os vendedores receberam a instrução de testar o produto na frente do cliente. Pelo menos todos os produtos que podem ser testados sem que precisem ser instalados exceto placas-mãe e outros dispositivos semelhantes seguem o procedimento de teste no ato da entrega. Quando o cliente decide comprar e instalar na própria loja ele ganha mais. Sai com a certeza do equipamento funcionando e ainda com a garantia do serviço. Pode sair um pouco mais caro, pois a empresa cobra pelo serviço, mas na minha opinião é mais seguro.

Há que se cercar de todas as precauções pois algumas peças boas podem ser trocadas por defeituosas. Nada é impossível. Para evitar isso a empresa desenvolveu e implantou um moderno sistema de rastreamento das peças comercializadas.

Desde que começou a investigação, que foi realizada por três áreas diferentes e cada uma em separado, que, a destilação dos ingredientes dessa sopa de trocas e devoluções muito revelou de hábitos do consumidor e de procedimentos errados que foram sendo corrigidos gradativamente.

Os procedimentos de troca e de devoluções foram determinados com base na Lei do Consumidor. O bom-senso aumentou a sensibilidade e passou a ouvir todas os envolvidos antes de decidir. Clientes ocultos foram às lojas conferir atendimento e postura dos vendedores e um novo cronograma de treinamento foi desenhado.

Porém o principal avanço foi a revoluçãointerna. Decidiu-se pela educação do cliente. No começo foi difícil dizer que não trocaríam produtos com defeito e sem laudo técnico da empresa ou da assistência técnica.

Muitos reclamaram e se valeram da Lei do Consumidor, mas os vendedores e gerentes estavam preparados inclusive para tirar as dúvidas e esclarecer sobre seus direitos e deveres do consumidor.

Para obter sucesso na empreitada a empresa capacitou seus colaboradores na Lei de Defesa do Consumidor, inclusive com a aplicação de testes escritos, onde só foram aprovados os que conseguiram notas acima de sete. Aqueles que não passaram na primeira prova foram para a recuperação, de forma que, todos concluíram o curso com notas acima de sete. Essa segurança quanto a informação e o material de apoio que foi entregue e ainda, o apoio interno do SAC que escuta todas as versões antes de decidir, fizeram com que a empresa reduzisse bastante suas despesas com trocas e passasse também a educar o cliente.

Conversando com os vendedores alguns afirmam que a batalha no começo foi muito difícil e que alguns ‘barracos’ aconteceram, mas agora estava tudo mais calmo. Ainda não tiveram nenhuma nova queixa no Procon, mas mesmo que aconteça a segurança dos vendedores quanto às medidas necessárias que vierem a ser tomadas é bem maior que a situação que existia anteriormente.

Porém, a melhor frase de toda essa campanha veio de uma gerente que me disse que a empresa ‘colocou o cliente nesse mal-costume e que precisava acabar com isso antes que o que parecia um remédio virasse um veneno.’

E é importante lembrar que todos os que trabalham nessa empresa sabem que além de vendedores também são consumidores.

Por isso amigos, antes que você saia por ai achando isso ou aquilo, culpando alguém ou não, faça como essa empresa fez: analise os dados. Uma pesquisa séria pode mudar muitas coisas na sua empresa e para bem melhor. Mas não faça isso sem a ajuda de bons profissionais.

A tendência no futuro das vendas é o serviço prestado e a segurança da solução vendida e isso só acontece com um forte trabalho de educação de colaboradores e clientes; de uma definição clara de objetivos, políticas e normas, tanto internas quanto externas e a informação das partes é fundamental para o sucesso dessa empreitada.

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Redação Geral

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