Por que a Telefônica quer a GVT

A GVT, que há poucos meses atrás, nada mais era que uma das empresas-espelho fadadas a extinção, está causando um furor no mercado de telecom e entre consumidores. Parece que foi de uma hora para outra. Mas não foi. A GVT preparou-se para este momento. Ela foi pensada e planejada para despertar o interesse de um comprador nacional ou internacional.

Foi o que aconteceu. Ao apostar na banda larga a GVT acertou. Partiu para cima da Oi e da Telefônica exatamente no seu ponto fraco. Deu certo. A GVT contou ainda com alguma sorte (aqui volto a falar que sorte é quando a preparação encontra a oportunidade). Dois fatos ajudaram a GVT a se popularizar. O primeiro foi vencer a ‘Guerra dos Cabos’ contra a Oi. Em decisão cautelar expedida em 06 de maio, por despacho do superintendente de serviços públicos interino, a Anatel mandou a Oi parar de cortar os cabos de telefonia da GVT que eram instalados em suas caixas e dutos, e determinou que as duas empresas fechassem acordo de compartilhamento no prazo máximo de 10 dias. Em nota, a Oi avaliou como positiva a decisão da Anatel de arbitrar a favor da negociação entre a Oi e a GVT para estabelecimento dos procedimentos operacionais e do ressarcimento de custos de compartilhamento de sua infra-estrutura de suporte à rede de acesso dedicada a condomínio ou domicílio. A Oi suspirou aliviada pois pegou mal a atitude dela.

Em outra situação a GVT também se beneficiou. Foi contra a Telefônica, provável compradora de 100% de suas ações. A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) publicou no Diário Oficial de União, o Despacho no 4.043/2009-CD, em que determinava a suspensão temporária da comercialização do serviço Speedy, da Telefônica. Porém em um total desrespeito a decisão da justiça e do governo, a Telefônica continuou vendendo assinaturas do Speedy com a alegação que ainda não havia sido notificada oficialmente. A nota foi divulgada no Diário Oficial e mesmo assim a Telefônica desobedeceu. Para a Anatel, a publicação no Diário Oficial já era uma notificação.

Apósa divulgação da desobediência por parte da Telefonica a empresa suspendeu as vendas a partir de meia-noite daquele dia, após ter recebido o comunicado da Anatel. A empresa recorreu contra a determinação, mas teve que esperar.

Hélio Costa, Ministro das Comunicações defendeu a liberação antes mesmo que a Telefônica provasse que havia corrigido os problemas. “A essas alturas eu acho que já valeu. O castigo foi merecido e já foi cumprido. Mas, agora, a gente não pode prejudicar o usuário não, temos que refazer isso o mais depressa possível”, disse o ministro, em entrevista, onde defendeu a liberação da venda do Speedy. Em 07 de julho deste ano, na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados, o presidente da Telefônica, Antonio Carlos Valente, garantiu que até o fim do ano seria feita uma melhoria efetiva na rede de banda larga Speedy e no sistema de atendimento ao cliente. A Anatel não se convenceu e manteve a decisão de não liberar a venda do Speedy.

Enquanto essa briga continuava a GVT aumentava o seu plano de expansãoe depois de ter anunciado a expansão no Nordeste, a GVT ampliava sua atuação também no Espírito Santo e iniciava as operações nas cidades do Recife e de Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco. Ao entregar o que prometia a GVT ganhou a confiança dos consumidores que, cansados de receber um serviço de péssima qualidade, migrou para os pacotes oferecidos pela empresa. Além de ampliar a base de clientes a GVT conseguia fazer isso exatamente no quintal dos seus concorrentes. A satisfação desses consumidores, ampliada pelo boca-em-boca, transformou a GVT, de uma hora para outra, na ‘namoradinha dos internautas carentes de uma boa banda larga’.

Neste meio tempo surgiu a primeira proposta. Com uma oferta para comprar a GVT por R$ 5,4 bilhões – prometendo R$ 42 por ação – o grupo francês Vivendi ensaiou entrar no maior mercado de telecom da América Latina no que seria uma barganha, como disse em Paris, o presidente da Vivendi. “O negócio nos permite entrar num país promissor por um preço muito razoável”, disse Jean-Bernard Levy em entrevista à Reuters.

Na nota que divulgou a oferta amigável, o presidente da Vivendi afirmou que “este acordo com a GVT atende o objetivo estratégico da Vivendi de expansão entre as economias que apresentem rápido crescimento. GVT desenvolveu soluções originais e inovadoras em serviços de banda larga e já apresentou resultados muito animadores”. Os acionistascontroladores da GVT, diante da oportunidade de negócio,concordaram em vender à Vivendi um mínimo de 20% de participação na GVT, de um total de aproximadamente 30% que eles atualmente possuem. Naquele dia antes do fechamento do pregão na Bovespa, as ações da GVT chegaram a subir 19,5%. O forte da Vivendi seria unir conteúdo a eficiência de entrega de banda. Parecia que seria este o fim, mas uma nova reviravolta aconteceu.

Um mês depois da GVT iniciar a oferta do acessos banda larga de 100 mega, a Oi anunciava o Oi Velox Ultra. O lançamento do acesso a 100 Mbps começava a ser vendido somente na região metropolitana da capital pernambucana-Recife, Olinda e Jaboatão dos Guararapes. O lançamento foi um rearranjo do portfólio, uma vez que o Oi Ultra Velox já incorporava ofertas já existentes, de até 8 megas, e as velocidades de 14, 20, 40 e 60 Mbps, essas com preços a partir de R$ 109,90 para os clientes residenciais. Não deu certo.

Em agosto, a GVT divulgou comunicado informando que dois fundos norte-americanos, o T. Rowe Price Associates e o T Rowe Price Internacional compraram, no final de julho, 5,08% do total das ações ordinárias da GVT Holding. Segundo a nota, o objetivo dessa aquisição era estritamente para investimento, não havendo intenção de participar do controle acionário ou da estrutura administrativa da GVT.A GVT seguiria com seu programa de expansão cujo objetivo é também acelerar a entrada em novos mercados. Porém, este investimento era um energético necessário a acelerar a provocação em busca de novos compradores em potencial que cobrissem a proposta da Vivendi. Deu certo.

No início de outubro, os papéis ordinários da GVT dispararam 15% após o Conselho de Administração da Telefônica aprovar o lançamento de uma oferta pública voluntária para a aquisição de até 100% das ações de emissão da GVT pelo preço de R$ 48,00 por ação, com pagamento em dinheiro. A Telefônica desembolsaria aproximadamente R$ 6,5 bilhões. A oferta da Vivendi estava coberta. Instalava-se a euforia. Além da Telefônica e Vivendi havia o rumor de que a Telmex também participasse do processo. A Telmex estaria disposta a não perder a sua liderança na banda larga, pois duas de suas empresas – Net e Embratel – seriam bastante atingidas caso uma ou outra viessem a adquirir a GVT. Porém, quem mais sofreria seria mesmo a Oi. O impacto seria sentido, principalmente, no mercado corporativo e governamental na região Centro-Sul, pois a Oi não tem o perfil corporativo, ao contrário da Telefônica.Do ponto de vista legal tudo indica que a Anatel virá a aprovar o negócio.Mas a GVT não se pronunciou. Fontes da empresa consideraram ‘hostil’ a oferta – já que não fora previamente acertada entre os controladores das duas empresas – mesmo inesperada, foi encaminhada para avaliação do conselho de administração.

Na guerra pela GVT a Telefônica deu o lance mais alto. Muitos consumidores protestaram pois, não queriam ser atendidos pela Telefônica que já possuía um pessímo retrospecto com o Speedy. Apesar de inundarem a Ouvidoria da empresa com mensagens contrárias a venda para a Telefônica a GVT mostrou-se favorável à venda para a quem desse a melhor proposta, mesmo não explicitando isso em nenhum comunicado oficial.

Dias antes disso, em entrevista ao portal R7, Fábio Bruggioni, diretor-executivo de segmento residencial da Telefônica, disse que a popularização da internet no Brasil e o preço da telefonia fixa seriam os responsáveis pelas constantes interrupções nos serviços.O fato foi mais uma provocação a irritar os consumidores. Ao negar que a empresa esteja despreparada para atender às atuais exigências dos internautas o executivo mostrou mais uma vez o tamanho da falta de humildade que a empresa possui e o quanto isso ainda é diretamente proporcional ao péssimo atendimento prestado aos seus usuários.Em um dos trechos da entrevista Bruggioni afirmou que “nosso número de reclamações é alto (Telefônica), mas proporcionalmente menor que o da concorrência” (de quem ele estava falando? Da Oi?). Se o executivo falava da Oi, o pior é que, ao se comparar ao seu concorrente, a Telefônica sacramentou o ditado que diz ser “o roto falando do esfarrapado”. Para quem não sabe, a Telefônica é uma das campeãs absolutas de reclamações no site www.reclameaqui.com.br . A idéia seria usar qualquer recurso que venha a aproximar a empresa ao seu cliente. Este recurso se chama GVT.

O presidente da Telefônica, Antonio Carlos Valente, na mesma época, disse esperar que a ANATEL conceda a autorização para a compra da GVT até o dia da oferta pública de ações (OPA) na Bovespa, agendada para 19 de novembro, proximo. Ao contrário do grupo francês Vivendi, que conversou com os atuais acionistas da GVT, a Telefônica não manteve qualquer contato. Apenas anunciou a sua proposta sem ser convidada.

A oferta não foi considerada hostil porque oficialmente a GVT não a rejeitou em nenhum momento, mas também não foi consensual como pode se imaginar. Exatamente por isso, a Telefônica espera que a Anatel conceda a anuência prévia ao negócio até o dia 19 de novembro, quando ocorrerá a OPA na Bovespa. A GVT convocou para o dia 3 de novembro uma Assembleia Geral de Acionistas. Em Informação Relevante datada de 13/10 a GVT decidiu convocar a Assembléia Geral Extraordinária da Companhia com a finalidade de deliberar sobre o pedido de dispensa da aplicação dos artigos 43 e 44 do Estatuto Social da Companhia que tratam da “Proteção da Dispersão da Base Acionária da Companhia”.

Na opinião do Conselho, considerando que Vivendi, Telesp (Telefônica) ou um terceiro interessado podem realizar uma oferta concorrente, a GVT decidiu realizar revisão de sua oferta atual no caso específico da Telesp, ou comprar ações da Companhia por um valor superior ao valor descrito no Edital de Oferta da Telesp. Esta revisão, segundo eles, será benéfica a todos os acionistas da Companhia e a própria Companhia. A GVT recomenda aos acionistas que a venda das ações seja feita a um Ofertante Qualificado que “tenha capacidade financeira de adquirir 100% das ações da Companhia a um preço de no mínimo R$ 48,00 por ação; e seja um operador ou provedor de serviços de telefonia pública móvel, fixa e de banda larga no Brasil ou no exterior, diretamente ou por seu intermédio de suas subsidiárias, controladas ou coligadas.” (Só faltou falar o nome da Telefônica). O Conselho de Administração confirmou que tanto a Vivendi como a Telesp podem ser definidos como ‘Ofertantes Qualificados’.

Diante dos argumentos os Conselheiros aprovaram a convocação de Assembléia Geral Extraordinária de Acionistas para que seja deliberada a dispensa da aplicação dos artigos 43 e 44 do Estatuto Social da Companhia para aquisição de ações que seja por um preço de no mínimo R$ 48,00 por ação; seja realizada por um Ofertante Qualificado; a liquidação financeira seja realizada até 28 de fevereiro de 2010; e o pagamento pela aquisição das ações seja em dinheiro. O Edital de Convocação para realização de Assembléia Geral Extraordinária de Acionistas para deliberarem sobre a dispensa da aplicação dos artigos 43 e 44 do Estatuto Social da Companhia foi publicado imediatamente para que a decisão final saia o mais rápido possível.

Por outro lado a Telefônica já planeja ampliar a presença nas classes C e D, em uma diretriz oposta à sua principal rival no Estado, a Net Serviços, que centraliza suas operações nas classes A e B, segundo revelou o presidente da operadora, Antonio Carlos Valente, na sua participação no Futurecom 2009. Até dezembro, salientou Valente, a banda larga (Speedy) estará presente em 591 localidades de São Paulo. Em março de 2010, a promessa é chegar aos 622 municípios atendidos pela operadora – São Paulo tem 645 municípios, mas em 23 deles a Telefônica não atua, sendo essas localidades atendidas pela CTBC.

Pelo histórico a Telefônica deverá sim adquirir a GVT. Somente um decisão com visão de longo prazo da Vivendi poderia mudar o que tende a ser a maiior aquisição da Telefonica. A Anatel deverá aprovar a operação, o conselho também e a Bovespa só terá um leilão se a Vivendi imaginar que o Brasil possui um grande potencial para venda de conteúdo. Não se pode culpar os investidores que nada mais desejam que obter o lucro (o que é justo), principalmente depois do desastre americano que quase quebrou o mundo no ano passado.

Na história dois casos me chamam atenção. Quando estava crescendo e sua marca valorizando mais e mais a cada mês a Harley-Davidson vendeu parte das suas ações para a AMF- American Foundry & Machine Corporation. Mal sabiam que por causa disso a Harley-Davidson iria passar pelos seus piores momentos. A ânsia do lucro a qualquer custo, diante do aumento vertiginoso das encomendas, fez muitas Harley-Davidson saíram de fábrica com a marca Harley-Davidson e AMF pintadas no tanque.

O fato gerou revolta nos consumidores que consideravam aquilo um desrespeito. Mas o pior estava por vir. A pressa fez com que muitas motos fossem fabricadas com vários problemas, dentre eles, vazamentos constantes de óleo o que obrigava aos seus proprietários a andar com kit de ferramentas. Para piorar, as motos japonesas começavam a entrar e a tomar boa parte do mercado americano, trabalhando exatamente em cima das falhas da Harley. O pesadelo durou quase 11 anos. Mas a Harley-Davidson deu a volta por cima. Beals e outros 12 executivos, incluindo William G. Davidson, neto de William Davidson, tornaram-se proprietários da Harley-Davidson. O negócio se deu em 1980. A recompra das ações trouxe de volta, em menos de três anos, a confiabilidade. A história da marca, a satisfação do cliente e a dignidade dos funcionários foi recuperada. Foram os operários os que mais vibraram pois sempre se viram como artesãos. Assim, os funcionários, agora acionistas, voltaram a produzir motos com estilo.

Outro casotrata da Coca-Cola. Em 1985, a Coca-Cola cometeu um terrível erro de marketing. Após 99 anos de sucesso, ela abandonou sua fórmula da coca-cola original. Surgiu a New Coke, com um gosto mais doce e suave. A empresa anunciou o novo sabor com uma verdadeira festa de propaganda e publicidade. A princípio a New Coke vendeu bem. Mas as vendas logo caíram, a medida que o público reagia. A Coca-Cola começou a receber grandes quantidades de cartas e mais de 1.500 telefonemas diários de consumidores revoltados. Um grupo chamado “Old Cola Drinkers” iniciou protestos, distribuiu camisetas e ameaçou abrir um processo, a menos que a Coca-Cola trouxesse de volta a fórrnula antiga. A maioria dos experts de marketing previu que a New Coke seria o “Edsel dos Anos Oitenta”. Após três meses, a Coca-Cola trouxe a antiga coca de volta. Agora denominada “Coke Classic”. No final de 1985, o numero das vendas da Classic batia o da New Coke nos supermercados por dois a um. Em meados de 1986, as duas maiores fontes de renda da empresa, McDonald’s e Kentucky Fried Chicken, tinham voltado a servir a Coke Classic em seus restaurantes. Urna reação rápida salvou a empresa de um desastre em potencial. A Coca-Cola focou na Coke Classic e reduziu a New Coke a um papel secundário, de apoio. Em 1987, a Coke Classic era novamente a sua principal marca e o líder dentre os refrigerantes dos EUA.

A Telefônica decidiu comprar a GVT para encurtar o caminho entre o que ela não consegue fazer hoje e o que está pronto e funcionando. Se a Telefônica decidisse investir pesado na concorrência com a GVT ainda levaria alguns anos para chegar a incomodar o crescimento da pequena fornecedora de banda larga. Isso não seria bom. Principalmente se o comprador fosse a Vivendi. Ao comprar a GVT a Telefônica pode, se manter a qualidade da conexão, ressuscitar o Speedy e diminuir a rejeição dos consumidores. Mas pode ser que isso não venha a ocorrer. Um ‘pode ser’ que está mais para ‘será’.Duas coisas podem mudar isso. Uma delas seria a Vivendi enxegar um futuro rentável na GVT. O outro seria os acionistas apostarem que sem a Telefônica e a continuarem a expansão, a GVT, pode vir a valer ainda muito mais. É uma decisão entre a fome a a vontade de comer. Vencerá a que for mais forte independente da opinião de quem paga pelo serviço.

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Redação Geral

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